Em entrevista, presidente da ONG “Tortura Nunca Mais”, Cecília Coimbra, reage com indignação ao recuo de Dilma na proposta de acabar com o sigilo eterno dos documentos públicos.
Passada a fase mais aguda do imbróglio desencadeado pela evolução patrimonial do ex-ministro Antonio Palocci, a expectativa na base aliada era de um período de calmaria e boas notícias.
Mas para frustração do Palácio do Planalto, a estratégia de adotar uma agenda positiva para enterrar a crise acabou ficando em segundo plano devido à decisão da presidente de recuar na proposta de acabar com o sigilo eterno dos documentos públicos.
Diante da forte reação do movimento de Direitos Humanos e de partidos aliados, Dilma acabou por retirar a urgência do projeto que tramita no Congresso. Ou seja, a polêmica ficou para depois.
Nessa entrevista, a presidente da ONG "Tortura Nunca Mais", Cecília Coimbra, reage com indignação ao recuo de Dilma. "Algumas pessoas esquecem o passado quando assumem o poder".
Como avalia o retrocesso do governo na decisão de manter o sigilo eterno dos documentos oficiais?
Isso é terrível, um retrocesso. Ouviram muito pouco os familiares dos mortos e desaparecidos durante a ditadura e os movimentos de direitos humanos. É claro que isso interessa também a toda sociedade, aos historiadores e aos pesquisadores, mas as pessoas que estão nessa luta há 30 anos não foram sequer consultadas.
A postura de Dilma é um achincalhe a toda proposta feita pela Secretaria Especial de Direitos Humanos. A própria Comissão da Verdade, que está travada na Câmara, para nós é uma Comissão da mentira. É uma grande misse-en-scène para a mídia.
Acredita que a presidente Dilma Rousseff recuou devido à pressão dos ex-presidentes Fernando Collor e José Sarney?
É claro que o sigilo eterno interessa a eles devido às coisas pouco honradas feitas em seus respectivos governos. Mas existe também uma pressão do ministério da Defesa que não aparece, também de segmentos militares.
O ex-deputado José Genoino, que foi preso político e esteve na guerrilha do Araguaia, aceitou um convite para ser assessor do ministro Nelson Jobim no Ministério da Defesa. Como avalia essa decisão e a atuação dele na pasta?
Acho isso péssimo, lamentável. Ele manchou toda sua história de vida e resistência.
Não acha que Genoino pode ser um contraponto dentro de um ministério conservador?
De jeito nenhum. Achar isso é pura ingenuidade. E sabemos que o José Genoino não é ingênuo. Trata-se de uma crença política de que o possível, hoje, é isso.
Ele nunca nos procurou. É uma coisa muito estranha ele aceitar a Medalha do Pacificador, a Comenda mais alta do Exército que foi dada aos torturadores.
A presidente Dilma é uma ex-presa política. Esperava dela outra postura devido ao seu passado?
As marcas de quem foi preso e torturado ficam com a gente a vida inteira. Não saem. Espero que essas marcas falem mais alto à presidente do que os acordos que foram feitos.
Mas infelizmente os acordos estão prevalecendo. Algumas pessoas esquecem o passado quando assumem o poder ou determinados cargos.
Que acordos?
Desde a anistia, vários acordos foram feitos. Quando o (ex-presidente) Sarney assume, outros acordos foram selados. Quando Lula assume, idem. Eu fui do PT e deixei o partido indignada. Nós assistimos esse processo dentro do PT na primeira e na segunda eleição do Lula. Os acordos foram feitos com forças que respaldaram a ditadura e efetivamente participaram do estado de terror.
Como avalia o desempenho da ministra dos Direitos Humanos, Mariado Rosário?
Ela chegou com um discurso muito interessante. Isso fez com que esperássemos algo mais que o Paulo Vanucchi fez. Mas infelizmente quem ocupa essa pasta sai queimado.
Até quando o projeto de lei que cria a Comissão da Verdade ficará travado no Congresso?
Essa é uma prática que vem sendo utilizada desde 1985; a produção do esquecimento. Trabalho com psicologia social e vejo muito isso. Mesmo o pessoal dito de esquerda, militante, acaba esquecendo o projeto que está lá, que é tetraplégico.
Por que tetraplégico?
Olha, digo isso com todo respeito aos tetraplégicos. Mas o projeto é uma farsa porque retiraram do texto o período da ditadura militar, de 1964 a 1985. Nós não falamos em condenação, mas em conhecer, dar publicidade e responsabilizar os torturadores. O Brilhante Ulstra, por exemplo, tinha que contar tudo que viu e que fez.
Os militares dizem que esse procedimento também devia valer para os militantes de esquerda...
Já fizeram isso com a gente. Todos nós respondemos a processos. Vários militantes foram julgados a revelia. As pessoas foram banidas do Brasil e tiveram filhos no exterior. Nós respondemos e muito.
O que o "Tortura Nunca Mais" pretende fazer?
Encaminhamos diversos pedidos de audiência para a Dilma e nem recebemos resposta. Lembre-se que o Brasil foi condenado pela OEA. O governo tem até dezembro para responder a Corte da OEA. Até agora, nada.
A presidente do "Tortura Nunca Mais" de São Paulo, Rose Nogueira, e outras ex-presas políticas estiveram na posse de Dilma e foram recebidas por ela. Por que a senhora não foi?
Porque eu não vou lá fazer número e mostrar que esse é um governo aberto, democrático e participativo. Queremos ações concretas. Queremos que a presidente nos receba.
Pretende mover alguma ação contra o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que várias vezes afirmou que só cachorro busca osso?
Não vamos dar mais alimento e adubar fala de fascista.
FONTE: Brasil Econômico
Mas para frustração do Palácio do Planalto, a estratégia de adotar uma agenda positiva para enterrar a crise acabou ficando em segundo plano devido à decisão da presidente de recuar na proposta de acabar com o sigilo eterno dos documentos públicos.
Diante da forte reação do movimento de Direitos Humanos e de partidos aliados, Dilma acabou por retirar a urgência do projeto que tramita no Congresso. Ou seja, a polêmica ficou para depois.
Nessa entrevista, a presidente da ONG "Tortura Nunca Mais", Cecília Coimbra, reage com indignação ao recuo de Dilma. "Algumas pessoas esquecem o passado quando assumem o poder".
Como avalia o retrocesso do governo na decisão de manter o sigilo eterno dos documentos oficiais?
Isso é terrível, um retrocesso. Ouviram muito pouco os familiares dos mortos e desaparecidos durante a ditadura e os movimentos de direitos humanos. É claro que isso interessa também a toda sociedade, aos historiadores e aos pesquisadores, mas as pessoas que estão nessa luta há 30 anos não foram sequer consultadas.
A postura de Dilma é um achincalhe a toda proposta feita pela Secretaria Especial de Direitos Humanos. A própria Comissão da Verdade, que está travada na Câmara, para nós é uma Comissão da mentira. É uma grande misse-en-scène para a mídia.
Acredita que a presidente Dilma Rousseff recuou devido à pressão dos ex-presidentes Fernando Collor e José Sarney?
É claro que o sigilo eterno interessa a eles devido às coisas pouco honradas feitas em seus respectivos governos. Mas existe também uma pressão do ministério da Defesa que não aparece, também de segmentos militares.
O ex-deputado José Genoino, que foi preso político e esteve na guerrilha do Araguaia, aceitou um convite para ser assessor do ministro Nelson Jobim no Ministério da Defesa. Como avalia essa decisão e a atuação dele na pasta?
Acho isso péssimo, lamentável. Ele manchou toda sua história de vida e resistência.
Não acha que Genoino pode ser um contraponto dentro de um ministério conservador?
De jeito nenhum. Achar isso é pura ingenuidade. E sabemos que o José Genoino não é ingênuo. Trata-se de uma crença política de que o possível, hoje, é isso.
Ele nunca nos procurou. É uma coisa muito estranha ele aceitar a Medalha do Pacificador, a Comenda mais alta do Exército que foi dada aos torturadores.
A presidente Dilma é uma ex-presa política. Esperava dela outra postura devido ao seu passado?
As marcas de quem foi preso e torturado ficam com a gente a vida inteira. Não saem. Espero que essas marcas falem mais alto à presidente do que os acordos que foram feitos.
Mas infelizmente os acordos estão prevalecendo. Algumas pessoas esquecem o passado quando assumem o poder ou determinados cargos.
Que acordos?
Desde a anistia, vários acordos foram feitos. Quando o (ex-presidente) Sarney assume, outros acordos foram selados. Quando Lula assume, idem. Eu fui do PT e deixei o partido indignada. Nós assistimos esse processo dentro do PT na primeira e na segunda eleição do Lula. Os acordos foram feitos com forças que respaldaram a ditadura e efetivamente participaram do estado de terror.
Como avalia o desempenho da ministra dos Direitos Humanos, Mariado Rosário?
Ela chegou com um discurso muito interessante. Isso fez com que esperássemos algo mais que o Paulo Vanucchi fez. Mas infelizmente quem ocupa essa pasta sai queimado.
Até quando o projeto de lei que cria a Comissão da Verdade ficará travado no Congresso?
Essa é uma prática que vem sendo utilizada desde 1985; a produção do esquecimento. Trabalho com psicologia social e vejo muito isso. Mesmo o pessoal dito de esquerda, militante, acaba esquecendo o projeto que está lá, que é tetraplégico.
Por que tetraplégico?
Olha, digo isso com todo respeito aos tetraplégicos. Mas o projeto é uma farsa porque retiraram do texto o período da ditadura militar, de 1964 a 1985. Nós não falamos em condenação, mas em conhecer, dar publicidade e responsabilizar os torturadores. O Brilhante Ulstra, por exemplo, tinha que contar tudo que viu e que fez.
Os militares dizem que esse procedimento também devia valer para os militantes de esquerda...
Já fizeram isso com a gente. Todos nós respondemos a processos. Vários militantes foram julgados a revelia. As pessoas foram banidas do Brasil e tiveram filhos no exterior. Nós respondemos e muito.
O que o "Tortura Nunca Mais" pretende fazer?
Encaminhamos diversos pedidos de audiência para a Dilma e nem recebemos resposta. Lembre-se que o Brasil foi condenado pela OEA. O governo tem até dezembro para responder a Corte da OEA. Até agora, nada.
A presidente do "Tortura Nunca Mais" de São Paulo, Rose Nogueira, e outras ex-presas políticas estiveram na posse de Dilma e foram recebidas por ela. Por que a senhora não foi?
Porque eu não vou lá fazer número e mostrar que esse é um governo aberto, democrático e participativo. Queremos ações concretas. Queremos que a presidente nos receba.
Pretende mover alguma ação contra o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), que várias vezes afirmou que só cachorro busca osso?
Não vamos dar mais alimento e adubar fala de fascista.
FONTE: Brasil Econômico
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